Brasil pede perdão a familiares de assassinados/torturados na ditadura brasileira
Após sessão em homenagem aos 88 anos do PCdoB na Câmara de São Paulo, a Comissão de Anistia julgou cinco pedidos. Entre eles os dos comunistas Dinaelza Coqueiro e Maurício Grabois, o do ex-militante da ALN, Vanderley Caixe e de outros três requerimentos de familiares de Angelo Arroyo. A todos, o Estado brasileiro – através da vice-presidente da Comissão, Suelli Bellato – pediu perdão pelos males causados aos perseguidos pela ditadura.
Vitória, filha de Maurício Grabois, fala sobre o paiO primeiro caso julgado foi o de Maurício Grabois. Sua família pleiteou apenas a declaração de anistiado, abrindo mão da reparação econômica.
Vitória Lavínia, filha do dirigente comunista morto pelos militares em 1973 durante a Guerrilha do Araguaia, disse que “nossa família foi especialmente atingida. Perdi meu pai, meu irmão André e meu marido Gilberto (Olimpio Maria)”. Para ela, “a ditadura foi devastadora porque matou os melhores filhos de nosso povo”.
Vitória também protestou, defendendo a abertura dos arquivos e a busca dos restos mortais dos desaparecidos. “Também queremos justiça e que os assassinos da ditadura sejam julgados e condenados por seus crimes”.
Líder do PCdoB, Maurício Grabois exerceu intensa militância política junto ao partido e em prol das liberdades democráticas. Assumiu papel de destaque na Guerrilha do Araguaia e, segundo relatos, morreu em novembro de 1973 pelas mãos do regime militar. Consta do rol dos mortos e desaparecidos políticos e até a presente data, seu corpo não foi encontrado.
Famílias mutiladas
Em seguida, Dolores Arroyo (na foto, emocionada), viúva de Ângelo, morto em 1976 na Chacina da Lapa, Lenine e Camila Arroyo, filhos, foram anistiados. Os três tiveram de mudar sua identidade devido à perseguição política.
Dolores – hoje com 80 anos – e Ângelo – que completaria 82 –, eram operários e militantes comunistas que se casaram em São Paulo em 1953. Por sua atuação, Dolores foi presa em 1950 por “atentado contra a liberdade do trabalho” e “paralisação de trabalho seguida de violência ou perturbação da ordem”.
Com o golpe de 1964, a família passa a viver na clandestinidade e muda-se para Anápolis (GO), onde adota o nome de Maria Cordona. Seu marido passou a ser Agenor Cardoso e os filhos Antonio Cardoso e Encarnação Cardoso. Camila e Lenine foram afastados do convívio familiar com seu pai diante do acirramento das perseguições ao dirigente. Ambos ficaram sabendo de sua morte pelos jornais e não puderam acompanhar seu enterro.
Dinaelza Coqueiro, guerrilheira morta no Araguaia em abril de 1974, também foi anistiada em caráter post mortem. Sua mãe, Junilia Soares Santana, hoje com 90 anos, receberá a indenização paga pelo Estado devido ao fato de ter ficado comprovado que sua filha era arrimo de família quando passou a ser perseguida.
“Mariadina”, como era conhecida, era uma das guerrilheiras mais temidas pelos militares, conforme depoimentos de camponeses da região do Bico do Papagaio – que engloba partes dos estados do Pará e de Goiás, atualmente Tocantins – onde aconteceram os confrontos da Guerrilha do Araguaia.
Conforme o livro “Direito à Memória e à Verdade”, da Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República, ela teria sido capturada pelos militares e morta quando já não oferecia resistência. Antes, ela teria enfrentado seus algozes, cuspindo a cara de um deles e xingando o Major Curió.
Para Diva Santana (foto), sua irmã, que representava a mãe na sessão, “a concessão da anistia é um resgate da história de Mariadina. Quero manifestar o meu reconhecimento à Comissão, que pela primeira vez, representando o Estado, pediu perdão a esses brasileiros. É uma contribuição à nossa história e ao nosso futuro”.
O último caso analisado foi o de Vanderley Caixe. Membro e militante da Frente Aliança Libertadora Nacional, foi punido pelo Ato Institucional nº 02. Indiciado em inquérito policial e denunciado como incurso nas penas da Lei de Segurança Nacional, ficou preso por cinco anos. Como advogado, atuou em favor dos trabalhadores rurais na Paraíba. Ainda no ramo do Direito, tem trabalhado em prol de presos políticos latino-americanos com atuação junto à Corte Interamericana e da Comissão de Direitos Humanos da ONU.
Emocionado, Caixe reafirmou seus princípios socialistas e se disse agradecido pelo reconhecimento. “Sempre lutei e continuarei lutando pelo socialismo, pela liberdade”.
De São Paulo,
Priscila Lobregatte, com fotos de Marcos Slavov
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